segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Apesar da safra agrícola recorde, alimentos provocam avanço na inflação

por Almir  Cezar, da Sucursal Brasília
da Editoria de Economia da ANotA

Apesar da safra recorde, alimentos puxam inflação, que
se encontra acima do teto da meta oficial (Foto: EBC)
A inflação oficial divulgada pelo IBGE chegou a 6,51% em 12 meses, encerrados em agosto, acima do teto da meta.  Apesar da safra agrícola recorde, a maior pressão foi do grupo alimentação, com destaque para as frutas (crescimento em uma mês de 2,3%), mostra pesquisa da FGV, apesar do anúncio recente de safra agrícola recorde. A recente decisão do Banco Central de manter a taxa de juros alta em 11% é inócua e reforça a estagnação econômica anunciada com a "recessão técnica" noticiada na semana passada.

Inflação do grupo alimentos - Na última sexta-feira (05), o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) informou que o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) chegou a 6,51% em 12 meses, encerrados em agosto, acima do teto da meta, que é 6,5%. O centro da meta de inflação, que deve ser perseguida pelo BC, é 4,5%.

A pesquisa feita pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV) mostra que o Índice de Preços ao Consumidor Semanal (IPC-S) subiu de 0,12% para 0,21%, na primeira prévia de setembro. Sete dos oito grupos pesquisados apresentaram acréscimos. A maior pressão foi do grupo alimentação (de 0,13% para 0,29%), com destaque para as frutas (de 0,99% para 2,30%). O destaque que três dos cinco itens restantes que mais pressionaram o índice, são alimentos: leite tipo longa vida (3,22%); tangerina (28,40%); refeições em bares e restaurantes (0,32%). Os outros dois têm variações de seus preços indexados pela inflação geral: aluguel residencial (0,64%) e plano e seguro de saúde (0,73%).

Supersafra de commoditiesEm junho a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), divulgou o levantamento da produção de grãos no Brasil que chegou a 193,6 milhões de toneladas na safra 2013/2014. Esta estimativa representa aumento de 2,6% ou o equivalente a 4,9 milhões de toneladas acima da safra passada (188,7 milhões de toneladas).

Em relação à pesquisa do mês maio, houve incremento de cerca de 2,3 milhões de toneladas, devido à recuperação das lavouras de milho na primeira e segunda safras, feijão na terceira safra e trigo. A cultura desse grão apresentou crescimento 33,4%, atingindo 7,37 milhões de toneladas. O feijão total cresceu 32,3%, com 3,71 milhões de toneladas. O milho total (primeira e segunda safras) teve aumento de 3,6%, devendo ser colhidas 77,9 milhões de toneladas. 

Segundo a Conab, a área total destinada ao plantio de grãos deve chegar a 56,9 milhões de hectares, com uma alta de 6,2% se comparado à área de 53,6 milhões de hectares da última safra. A soja cresce 8,5%, passando de 27,7 milhões para 30,1 milhões de hectares. Outras culturas que ampliaram a área foram trigo (18,4%), arroz (0,2%), feijão total (11%).

A área plantada de soja deve ficar entre 26,42 e 27,32 milhões de hectares no período atual, contra 25,04 milhões de hectares na safra 2011/2012, o que representa um aumento de 5,5% a 9,1%. Apesar do crescimento de vários cultivos, mesmo aqueles ao consumo alimentar básico, o levantamento confirma que o plantio de soja tomou a área que foi destinada a outros grãos em anos anteriores, o que o mercado já prévia nos últimos meses.

O primeiro levantamento da Conab com relação à safra passada 2012/2013 a área total ocupada pelo plantio de grãos ficou em 52,21 milhões de hectares, resultado de 2,7% superior ao de 2011/2012. A produção, por sua vez, 182,27 milhões de toneladas, contra 165,7 milhões da safra passada, ou seja, há expectativa de crescimento de 10%.

Além do milho e do algodão, o arroz sofreu uma redução 2,9% na área plantada (de 2.426,7 para 2.356,7 a 2.393,7 mil hectares), e o feijão, de 2,3% (de 3.256,7 para 3,181,9 mil hectares). Como resultado, o consumidor esse ano (2014) acabou impactado por uma inflação desses alimentos.

Mercado prevê alta na inflação - A projeção de instituições financeiras para a inflação, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), subiu de 6,27% para 6,29%, este ano, de acordo com pesquisa feita semanalmente pelo Banco Central. Para 2015, a estimativa segue em 6,29%.

Na última sexta-feira, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) informou que o IPCA chegou a 6,51% em 12 meses, encerrados em agosto, acima do teto da meta, que é 6,5%. O centro da meta de inflação, que deve ser perseguida pelo BC, é 4,5%.

Juros em alta são inócuos e "recessão técnica" - Um dos instrumentos usados para influenciar a atividade econômica e, consequentemente, a inflação, é a taxa básica de juros, a Selic. Na semana passada o Banco Central decidiu manter a Selic em 11% ao ano. A explicação é que as elevações anteriores foram suficientes para gerar os efeitos esperados na economia.

Quando o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC), de modo a fazer com que a inflação fique dentro da meta estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional, aumenta a taxa Selic (Sistema Especial de Liquidação e de Custódia), o objetivo é conter a demanda aquecida, e isso gera reflexos nos preços, porque os juros mais altos encarecem o crédito e estimulam a poupança. O centro da meta é 4,5%, com limite superior de 6,5%.

Já quando o Copom reduz os juros básicos, a tendência é que o crédito fique mais barato, com incentivo à produção e ao consumo, mas a medida alivia o controle sobre a inflação. E quando mantém a taxa básica, como fez na semana passada, o comitê indica que elevações anteriores foram suficientes para produzir os efeitos esperados na inflação. Apesar do BC tem reiterado que os efeitos de alta da taxa básica se acumulam e levam tempo para aparecer, o patamar alta da taxa de juros mostra-se que não vem resolvendo o problema, enquanto isso paralisa a economia.

Juros altos exercem um efeito perverso sobre a mercado, pois são diretamente repassados aos preços dos produtos, o que dificulta vendas e compromete as margens das empresas, muitas vezes já pressionadas pelos importados. A atividade econômica registrou queda no segundo trimestre deste ano, de acordo com o Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br) dessazonalizado (ajustado para o período). A redução foi de 1,2%, comparado com o período de janeiro a março deste ano.  Ao mostrar dois trimestres seguidos de contração, a economia entra em recessão técnica.

Combate eficiente à inflação - Desde 2012, especialistas e o governo olham com atenção para o arroz e o feijão, os vilões da inflação daquele ano. Algumas medidas, como aumento dos estoques reguladores de arroz, reajuste do preço mínimo do feijão e mais crédito para os produtores do grão vêm sendo debatidas pelos órgãos públicos ligados ao setor de abastecimento, para estimular a produção desses grãos. Contudo, desde então pouco avançou.

O último Censo Agropecuário do IBGE, de 2006, mostra que a solução para a alta dos alimentos no Brasil é um grande desafio político, pois passa pela adoção, pelo poder público, de medidas estruturais que têm a ver com a justiça fundiária. Pela primeira vez o IBGE conseguiu levantar dados para ter um perfil da distribuição fundiária do país e medir a participação da agricultura familiar na produção nacional de alimentos. Com 30% de toda a área plantada, a pequena produção responde por 70% dos produtos da cesta básica.

Os números oficiais revelam ainda que 87% da produção nacional de mandioca, 70% do feijão, 46% do milho, 34% do arroz, 50% das aves, 59% dos suínos e 30% dos bovinos procede da agricultura familiar. Mas o modelo de política agrícola que prevalece no país desde o período colonial não facilita a vida dos pequenos agricultores. O país optou pela produção de commodities agrícolas para exportação e nunca fez reforma agrária.

Apesar da grande riqueza no campo gerado pelo agronegócio, o impacto é pequeno sobre o Produto Interno Bruto (PIB), o indicador para medir a atividade econômica do país. No cálculo do PIB a indústria responde por 30% e  serviços por 65% do total, enquanto que a agropecuária por meros 5%. E, embora, o PIB seja um bom indicador de crescimento, não é de desenvolvimento, que inclui outros dados como distribuição de renda, investimento em educação, entre outros aspectos.

Atualizado às 16h23

Com informações: Agência Brasil, Banco Central, IBGE e FGV

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